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DIGRESSÕES

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Reflexões ultra-sintéticas formuladas para veiculação através do tuíter @IgorBuys

DENSIDADE E SUTILEZA – SEGUNDO PASSO

1 -O senso comum descreve o que se situa AÍ, no campo dos fantasmas, como denso; e à essência, o que está sito AQUI, como da ordem da sutileza.

 

2 - Aliás, ainda não dissemos, mas a essência está posta AQUI, ou PARA AQUÉM do espaço-tempo, do agregado sensível, e, outrossim, PARA ALÉM daí.

 

3 - Há um transcendente interno e há um transcendente externo — ao eu. E entre este e aquele, o campo do transcendental, pré-mundano, e o mundo.

 

4 - Ao mundo, para usar dum termo clássico, também podemos chamar — o outro. Então, dizia-se: o senso comum entende o mundo, o outro como denso.

 

5 - Porém, hoje, se pode, por meio da linguagem da ciência indutivo-experimental, catastrofar tal noção e provar como é delgada, sutil a imagem.

 

6 - Quando se olha para o céu, se vê estrelas, segundo tal linguagem, imensamente distantes no espaço e no tempo, muitas, inclusive, já: mortas.

 

7 - É poeticamente nostálgica a idéia de estrelas mortas. O céu seria, pois, uma colcha de retalhos do tempo. Mas este gabinete não é diferente.

 

8 - Neste cômodo onde me acho, a luz também viaja no espaço e tempo. De sorte que o cachimbo sobre a mesa é mais moderno que o aquário à frente.

 

9 - As distâncias são relativamente ínfimas, mas, tal como no céu, tudo habita em tempos vários. A porta é dez vezes mais antiga que o cachimbo.

 

10 - A luz que toca o sorriso da namorada viaja no espaço e no tempo até que me afete; e, quando me chega, é mais moderna que a imagem de seu pé.

 

11 - Ora, se algumas estrelas estão mortas porque se já modificaram quando a luz que emitiram me atinge, o amor, o sorriso e a flor também estão.

 

12 - A composição físico-química de tudo estaria em mutação implacável, permanente. E as afetações do entorno são recebidas sempre com um atraso.

 

13 - Se ponho a mão sobre o tampo da mesa, tenho uma imagem tátil desta. Tal imagem, diz a ciência, percorre meu braço, nervos, sinapses e volta.

 

14 - Volta a partir do cérebro até minha mão. Onde, enfim se forma. Depois de codificada e decodificada por linguagens internas do corpo: eis AÍ.

 

15 - A imagem tátil da mesa. Bem assim, sua imagem visual. E a imagem auditiva que obtenho batendo sobre seu tampo: tudo tão rarefeito, ou sutil.

 

16 - Tudo tão volátil e ficcional. Tudo perfeitamente suposto, ou poético. Poiesis significa criação: produção do que é, a partir do que não era.

 

17 - Ora, a imagem gustativa do fruto que mordo não precede a minha experiência. Ao contrário: é criada por esta. E não é o fruto mesmo ou em si.

 

18 - Nitidamente, consoante a linguagem da ciência hodierna, todo o agregado sensível é diverso do em-si das coisas: pura abstração dos sentidos.

 

19 - Habitamos um mundo abstrato e um tempo que nada tem de absoluto, como queria Newton: é uma colagem de relatividades ajuntadas. Estão mortas?

 

20 - Ou estarão mais vivos, esses fantasmas referidos, do que as estrelas ditas mortas no firmamento? Surge a questão do astronômico e do ínfimo.

 

21 - Ora, o grande e o pequeno definem-se por oposição que diremos diádica ou caótica. Por que caótica? Porque se não pode pensar um sem o outro.

 

22 - O quente só é o quente em oposição ao frio; o claro ao escuro. O ínfimo ao astronômico. Alguns físicos-poetas antigos os diziam: contrários.

 

23 - As contrariedades, entanto, são o primeiro vislumbre de densidade com que nos deparamos neste discurso. Formam um: átomo infrangível, denso.

 

24 - Podemos batizar esse átomo, essa partícula do real de — Yin-Yang. Na lógica do poeta Parmênides e na de Kant, isso se explica como se segue.

25 - A = A, diz Parmênides. Logo A + (- A) = 0 e A = - (- A). Ou: A é não não-A, ensina Kant. O frio somado a seu contrário, o quente, se anulam.

 

26 - Mas o frio só é o frio, e o quente só é o quente, por se anularem e se definirem; se definirem e se já anularem, numa espécie de — pulsação.

 

27 - O grande e o pequeno, outro par xifópago, constitui uma unidade pulsante, muito densa, se repelindo e atraindo — violenta e incessantemente.

 

28 - Voltando a este gabinete, à sua analogia com o céu, se são matematicamente grandes-pequenas, astronômico-ínfimas as distâncias, algo é fato.

 

29 - Matematicamente, a porta ainda permanece sendo dez vezes mais antiga que o cachimbo sobre a mesa, quando me afetam os sentidos, uma e outro.

 

30 - O tempo e o mundo que sobre sua estrutura se constitui ainda é de urdidura um tanto fugitiva..., ficta, esgarçada ou precária, enfim: sutil.

A BANALIDADE DO MAL E SEU "MODUS" - TERCEIRO PASSO

1 - Enceto o terceiro passo desta reflexão sobre a banalidade do mal e seu “modus” por meio do postal que se segue, publicado por Leonardo Boff.

Lema do pensamento golpista e ditatorial:fit ratione voluntas: a vontade substitui a razão. O que é racional é o golpista que define.É golpe (sic) confira

2 - Boff destaca um aspecto do golpe de Estado em curso no País, nesta data: o império absoluto da vontade sobre a razão, i.e., o reacionarismo.

3 - O reacionarismo é definido como reação sistemática de grupo ou de grupos a mudanças que afetem o “status quo” para promover evolução social.

4 - O reacionarismo representa obediência cega a regras impostas, amiúde, em detrimento dos interesses de longo prazo dos próprios reacionários.

5 - O entreguismo é uma das fórmulas por meio das quais se externa o reacionarismo, que não vislumbra consequências para descendência ou pátria.

6- Os políticos entreguistas vendem seus votos, para concretizar o golpe, tendo em mente tão-só o interesse imediato nas propinas que percebem.

7 - As falanges de neofascistas que vão às ruas protestar contra programas sociais dirigidos aos mais pobres reagem regidas pelo ódio de classe.

8 - O reacionário é, antes de tudo, um obediente: o seu re-agir não é outra coisa, senão alienar o ato: deixar agir por si ideologia ou impulso.

9 - O impulso do reacionário é ideológico; sua ideologia, impulsiva. Não há espaço para reflexão nessa lapidificação da individualidade e do eu.

10 - O reacionário, por um lado, perdera a dimensão coletiva do eu: a nacionalidade; e, assim, lhe falta o cariz de criatura propriamente humana..

11 - Por outro lado, no seu agir não há sombra de individualidade; trata-se da repetição, sem filtro, de impulsos coletivizados, e naturalizados.

12 - O agir nasce, primo, no corpo: a Grande Razão. Exceto em Sócrates que, dito por Nietzsche um monstro, responderia incontinente com a lógica.

13 - O corpo sobre que fala Nietzsche não se confunde às suas imagens externas, sequer as teóricas; não é formado de células e modelos de átomos.

14 - Podemos considerar diversos corpos humanos necessários, um dos quais é parelho do id de Freud: é sede dos instintos, das pulsões e impulsos.

15 - Mas é sede, ainda, dos sentimentos, emoções, intuições. Fantasmas esses que são — abstrações do Eu profundo, tal como o é o corpo imagético.

16 - Porém, as imagens externas do corpo são divisíveis, já que constituídas no espaço-tempo; e os fantasmas internos são da ordem do: indivíduo.

17 - Ou do ilimitado. Por isso compõe a individualidade. Claramente, se não pode dividir um sentimento, uma emoção ou um instinto puro e genuíno.

18 - O impulso ideológico cristalizado e naturalizado opera em lugar do instinto, matando a individualidade. O reacionário não está deveras vivo.

19 - Bruce Lee define a arte marcial como “unnatural naturalness or natural unnaturalness”. É mister combinar controle e instinto harmonicamente.

20 - Do contrário, segundo Lee, ou o lutador se torna um “homem mecânico”, qual máquina morta; ou demasiado anticientífico: uma besta irracional.

21 - Já sugerimos que ser honesto demanda não obedecer nada antes do impulso; e, quanto a este, filtrá-lo pelo senso mais incrédulo e inquiridor.

22 - Pessoas livres são pessoas honesta, e vice-versa. “Honestamente expressar-se a si mesmo”, voltando a Lee, é fruto árduo de autoconhecimento.

23 - Joeirar o que brota do Eu profundo como manifestação pura da natureza mesma, misteriosa, e o que é apego cego a regras e aparências é árduo.

24 - Enquanto que obedecer cegamente a comando hierárquico, a falso impulso alienado ou ideologia incutida é fácil. Traz conforto e paz imediata.

25 - Os golpistas não-humanos, sem dimensão coletivo-nacional, e mecanizados, mortos, estão todos em paz, neste momento... Não conhecem a agonia.

26 - De “ágon” ou combate. Não conhecem o drama de existir e agir por si, livremente. Honestamente. Injetando da sua individualidade na História.

27 - E são, em geral, moralistas! Porque, assim, podem fingir obedecer ou mesmo desobedecer a algo — estático!... Mas, em hipótese alguma: viver.

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agosto 2016
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