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ENTREVISTA

DE 30 DIAS

 Entrevista de trinta dias corridos à  editora, colunista e atriz Marina Cervini

POESIA “GUARDA-ME” COMENTADA

Marina Cervini: Igor Buys, em suas poesias como o trecho da que foi postada acima, podemos notar uma mistura do sensível e acolhedor e ao mesmo tempo do erótico e sensual. Quais as suas fontes de inspiração e referencias para que esta fusão intensa de expressões esteja pressente em sua obra?

 

Igor Buys: Marina, você abstraiu quatro elementos do texto, (1) sensível, (2) acolhedor, (3) erótico e (4) sensual; e, em seguida, arrumou esses elementos em dois pares: sensível e acolhedor, de um lado, erótico e sensual, de outro. E fez isso com muita perspicácia. Bem, comecemos pela idéia de acolhimento, central na poesia que escolheu para fazer a arte acima: “GUARDA-ME”.


O apelo do eu-lírico nesse texto é por acolhimento, de fato; por recepção, por aceitação incondicionada — com dor —, plena. Aceitação à maneira de um parto invertido, imagem que utilizo em diversas poesias. Esse elemento acolhedor presente no texto como algo solicitado, almejado, buscado na parceira, na amada, é um elemento — côncavo, e, nesse primeiro sentido, feminino puro, receptivo; e é, mais adiante, um elemento maternal, que guarda — dentro de si; que abriga, envolve, que consola — e aqui começa a entrar o singelo, ou sensível, com a conotação que você deu ao termo. Entre o ombro e a face, entre os cabelos, entre os lábios que quase prendem a língua, entre os braços, em todos esses recessos e reentrâncias é vislumbrado, num primeiro plano, mais sensual, o elemento feminino, côncavo, receptivo — vaginal; e, num segundo plano, mais emocional, o elemento uterino, maternal. Depois, vêm novas imagens a reforçar essas sobreposições de idéias: uma posição física: me envolve com tuas coxas; mais adiante, meu rosto entre teus seios — protegido. O dedo adentrando a carne; o pedido de aceitação explícito, vindo na forma: “aceita-me, me abriga”, que procura transformar as duas idéias em jogo numa só: procura fundir o feminino e o maternal de vez. Do começo ao fim do texto, as matérias sensíveis com que se trabalha, água, aura, seda, saliva, lava, luz, e mesmo as aliterações, metaforizam a feminilidade: tudo isso é delgado, cede ao toque, é singelo, macio, é suavemente penetrável. Ao oco da palma, ao imo da alma, ao quarto de perfumes vai-se, sempre, com a mesma súplica por abertura física, sensível, ou sensual, e por acolhimento emocional.

Então, aí, há uma discussão sobre o significado desses elementos sensacionais relacionados à bem-amada no seu desdobramento emocional. E essa discussão é apresentada, — como numa tela, por meio de experimentações sensuais em texturas e ambientes cheios de claros e escuros. Há na poesia, ainda, o desejo de provocar na interlocutora — potencial — a sobreposição dos modos de receber feminino e maternal. Ou seja: o eu-lírico quer mãe, quer útero nessa poesia; deixa esse sentimento jorrar de si e inundar a bem-amada. Querer útero, enfim, é querer ir além da vagina; é querer alguma profundidade na relação. E, sob esse prisma, a proposta é decente, podemos dizê-lo. Mas suscita, em seu vácuo, uma questão subsidiária: se essa é a única forma de querer profundidade, ou se há outra, ou outras, inclusive, vislumbradas em “Versos Íncubos”. Matéria para um outro dia, quem sabe.

 

26 de abril de 2014

 

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