SAIBA ELE, O OUTONO
Saiba ele, o outono,
entre nós há apenas ternura. Não obstante,
enquanto ele segura o seio do céu na noite morna,
eu tenho os teus nas minhas mãos, feitos de opala;
e quando ele desliza a língua sobre os lábios d’Aurora,
sou eu quem pressinto o teu beijo, a tua língua de luz rósea.
Saiba ele, o outono.
Saiba ele, o tombar das folhas ruivas,
teus cabelos estão entre meus dentes, teu pescoço
de saliva e mel guarda a marca ardente do meu verso,
ligeira esfoladura que teus dedos procurarão subitamente,
enquanto o equinócio de março nos banha de sabores frutais
e a tua pele está no pêssego das tardes, no teu corpo existe
amora, pitanga e o favo do Artocarpus me inebria.
Saiba ele, o outono.
Saiba ele, o outono,
haverá um longo inverno, mas ao fim dessa estação de grises,
colheremos a rosa em tocha, beberemos seu vinho,
tocaremos com as pontas dos dedos o espinho
e celebraremos um pacto de singelez.
Saiba ele: o suave, o meigo outono.
Igor Buys
Ilha Grande, 21-03-2018
pintura corporal
