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TELÚRICA

Eu ainda vou rodar esse país inteiro,

virando, revirando cada pedra, cada galho,

cada rosto de mulher ou de menina

à procura dos teus traços, teus olhos,

tua pele, teus rastros ancestrais e vestígios.

Qualquer uma que se mova como ti,

que sorria com essas mesmas covas no rosto,

que se sente desabrochada como tu te sentas,

que apóie o queixo sobre o ombro,

que feche os olhos para sentir o vento,

auscultar o pôr do sol e os seus sussurros.

Qualquer uma que me traga algo de ti

eu vou amar; amar pelo chão, sobre as areias,

amar até montar dentro de mim uma sósia

completa, perfeita, capaz de preencher o oco

da tua ausência de todo e inteiramente.

Quero conhecer as pernas, as solas dos pés

das que cresceram pisando a mesma terra

e são filhas do mesmo sol que te dá sangue.

Quero beber as suas bocas, os seus seios,

deitar com elas sobre o mesmo mar incessante

que se salga da tua pele desde niña e te conhece,

te desnuda, penetra as tuas roupas, teus Sagrados.

Morder o fruto, provar o tempero, a pimenta,

me embeber dos cheiros, dos sons, instrumentos;

acariciar o verde das folhas vivas, o verde telúrico

que emerge do lençol d’água para o toque da luz

e explode e plange no teu olhar de mel e esmeralda!

Ou te encontro a ti mesma, ou te roubo em todas

e em tudo que me toque a alma nessa tua terra!

Ai, talvez haja uma gêmea desgarrada… Não sei.

Alguém a quem dourar os cabelos só por fora,

e ensinar a ser princesa sem deixar de ser gata

borralheira e selvagem. Tão doce, tão simplesmente

fêmea, menina e pantera ensangüentada. Como tu.

Igor Buys

Ilha Grande, 27 de fevereiro de 2020

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