GUARDA-ME
Sobre a poesia vide Entrevista de 30 Dias
Guarda-me contigo. No fundo do teu corpo. Entre teu ombro e tua face,
acolhe a minha face, febril,
o meu silêncio e cansaço.
Em meio aos teus cabelos,
teus desvelos, ai, teu abraço.
Quase presa entre teus lábios,
minha língua. Guarda-me
por inteiro, afunda-me
na tu’aura como em água
morna: me doa o teu calor
e cura do concreto
selvagem em meu olhar.
Guarda-me contigo;
senta-te aqui, de frente pra mim,
me envolvendo coas tuas coxas.
Agarra firme, bem firme
o meu pescoço; fala ao meu
ouvido, um e outro, meu
rosto entre teus seios, prot-
egido; meu dedo, e mais —
um, pouco a pouco adentrando
a tua carne: não os removas:
aceita-me, me abriga, sim:
com dor e amor, qual num parto.
Guarda-me contigo entre
os perfumes do teu quarto;
segura-me com tua mão
e do oco de tua palma (macia),
passa-me ao imo de tu’alma
de rosa ou de anêmona, não sei:
traga-me, devora-me, galopa
louca a minha ânsia; guarda-me!
entre unhas, dentes; afoga-me,
no mel da tu’Aurora, por vir;
incendeia-me, amor, rasga-te!
sangra junto com a noite!
estremece com o meu tremor;
me roça as pontas dos cabelos,
de seda e saliva, de lava e luz
rubra: hum, guarda-me as forças
e seivas, ah..., no fogo de tuas veias.
Igor Buys
In Versos Íncubos; ed. Scortecci, 2014