VERSOS MUTANTES
Se eu fosse um mutante
qual Zeus,
— o eterno Sonhador apaixonado,
numa noite assim, como esta,
de chuva e raio,
de lilases clarões envolventes,
bateria à tua porta numa forma
inusitada.
Bateria e bateria ansiosamente.
Abririas chocada: era teu pai, ora,
diante de ti, todo encharcado.
E triste, talvez. Deus, o que houve?
O motivo da visita: um mistério...
Ele só estava por perto, vagando.
Teve saudades. E, enfim, quis fugir
da chuva. Correu. Não deu tempo.
Sentado no sofá, ao teu lado,
secando os cabelos, ele diria:
o quanto te ama e tem orgulho
da mulher que te tornaste,
que te tornas, amor, a cada dia.
Olhos nos olhos, pareceria...
emocionado? Estava sensível.
Haveria um abraço profundo,
sentido. Seus dedos acariciariam
a contrapelo as tuas sobrancelhas.
Contornariam o teu rostinho e ele
te olhando muito, muito de perto...
Teu pai pediria pra estar assim:
bem assim, abraçado contigo,
por mais algum tempo só,
— um longo tempo, enfim... —
sorvendo o calor do teu carinho,
doando a sua própria febre
de ternura, face deitada na tua.
Depois, ele se iria; estava tarde.
Segurando os teus dois pulsos,
à porta, te fitaria... como nunca.
Minutos depois, bateria, bateria,
sem tocar a campainha, molhado,
muito molhado: um velho amigo.
Igor Buys
21 de outubro de 2012
in Versos Íncubos, 2014
Marjorie Marcelle