O TEU NOME
Há momentos na vida,
dias escuros de nuvens espessas,
minutos esticados feitos de um tempo elástic-
o que ameaça rebentar;
há recessos de mim, onde proliferam pó e teias… (fantasmas...);
onde há dúvida nos ossos, areia na saliva e uma rosa
morta. Há momentos assim
em que me socorro no teu semblante diáfano,
no teu sorriso, teu riso, tuas mãos.
E digo o teu nome.
Este é um grande segredo,
não o contes a ninguém,
que a vida passa, eu te esqueço,
ou esqueço que estás presente, transparente
e essencial como o ar que nunca louvamos,
por que nunca agradecemos;
mas, subitamente, na dor ou alegria,
este disfarce patético do abisso existencial,
há momentos em que, discretamente,
ou nem tanto, de mim para mim,
ou em voz alta: digo o teu nome.
Nos réveillons, nos turbilhões,
quando é gol do Flamengo e os gritos, os fogos
querem abafar o berro do silêncio,
o massacre dos desvalidos, a sujeição do nosso povo,
o vilipêndio da nossa terra, drogada e prostituída;
querem abafar os coturnos do imperialismo
fogos, artifícios explodem em meio aos mísseis,
às crianças iluminadas sorrindo, às crianças se apagando
sob escombros pelas Palestinas…
Há momentos recorrentes, em que estou numa
bolha, só, nu… não obstante haja gente e panos pudorosos
para agravo, momentos tais,
em que aproveito a algazarra externa
e, como oração ou mantra, digo o teu nome.
O teu nome.
Nunca me eximi do hábito por muito tempo.
Nunca desejei perdê-lo para sempre
-- e isto é um grande segredo, me promete --;
no fundo do copo ambarino uma face
inebriada a se distorcer
está imersa em fluido, refrata o entorno
ensurdecido
e conspira comigo contra a insignificância e vacuidade.
Com ou sem direito, comprometidos tu ou eu mesmo,
sem quase me dar conta...,
do fundo do peito,
de dentro do copo
digo o teu nome.
Igor Buys
Ilha Grande, 28 de novembro de 2019
Barbara Heck
