EU TANTO BRINQUEI DE DIZER QUE TE AMAVA...
Eu tanto brinquei de dizer que te amava.
Hoje, não brinco, perdeu a graça...
No céu marítimo, vai nadando uma garça.
E essa luz amarela, descendo em cascata,
amanteigando o ar, intumescendo a mata.
Nunca o Lábaro de um povo foi tão
realista: guache tremendo, incendiando tudo.
Eu tanto brinquei de dizer que te amava.
Hoje, perdi o jeito de poetizar a farsa...
A garça. O céu.
O poeta é um mentidor, já se o disse.
Criança pequena, pequena
e gigantesca, a brincar riscando sóis.
Mas o sol acima, alheio ao verbo,
entranha a pele, estala sobre os metais.
Denega toda fraude de vida: é vida incon-
-dicionada; áspera de sem cristal e seda.
Dura de permanente, conquanto fluxo.
A nuvem. A mata.
Sim: eu tanto brinquei de dizer que te amava.
Mas já não sei pô-lo em palavras.
Escrever é mentir, de certa forma.
E já é tempo de esculpir verdades
com mãos de sol.
Igor Buys
In "Versos Íncubos"; 2014
Foto da artista plástica Karline Arantes