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VERSOS ÍNCUBOS


Vem dar no meu verso, vem. Meu verso está suspenso onde podes achá-lo, é certo. Meu verso está na tua casa, senta-se à mesa. Espia por trás da cortina e vê quando passas, na madrugada íntima, com olhos vampiros. Meu verso é um intruso discreto, é filho da noite, e te ronda. Coa estaca entre as mãos, curiosa, vais relê-lo, conferi-lo, sorver seu feitiço, meigo e liquórico. Teu corpo lunar sabe tantas curvas. E meu verso é capaz de tocá-las como poucos até hoje o fizeram: estranho poder o da palavra nua. Meu verso te faz rir alto e te mata de raiva sincera, te deixa puta, te deixa louca, te deixa rouca, mas não esquece em ti. Por que o lês, neste momento?... E por que há brasa nas tuas faces? Meu verso está nos teus ouvidos, na tua memória, dorme ao teu lado entre lençóis, coxas, travesseiros e lumes. Meu verso se mistura a teu sangue, reverte em hormônio, calor, pudor conflito suave: nada demais: suor na nuca, cabelos presos na meia-noite insone e lenta. Engano-me? Minto?... Não me respondas. Não mintas tu ao meu verso, ao teu corpo e reverso: meu verso está nas tuas veias, na tua roupa, mistura-se aos teus perfumes, flutua-te em torno transborda-te, resume-nos e nos une numa con- versão* efêmera, mas terna e amiga. Quem sabe algum dia... Quem sabe. Mas o meu verso não pede a tua pele algum dia; sabe tocá-la agora, neste instante, sabe beijar teu mamilo, roçar sobre ele a pálpebra febril, e tem o dom de pressenti-la. Ai, se queres esganá-lo! cobri-lo de insultos! então, o faz. Mas se queres guardá-lo no seio, ninguém o saberá: meu verso é segredo, tal como o céu, que todos vêem. E, no fim das contas, teu corpo e meu verso talvez se conheçam, há muitos mundos... Ele apenas rouba a tua atenção: como um velho amigo. Igor Buys 27 de abril de 2011 _________ *Aurélio: Psiq. Processo em virtude do qual emoções se convertem em manifestações físicas.

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