DIGRESSÕES
Reflexões ultra-sintéticas formuladas para veiculação através do tuíter @IgorBuys
A BANALIDADE DO MAL E SEU “MODUS” – PRIMEIRO PASSO
1 - Nada como começo de relação — ou de namoro, como ela diz — para nos sedar diante de toda adversidade do entorno. É (quase) uma droga.
2 - Não no sentido de ser algo sem importância. Obviamente. Mas no de impor o império dos sentidos sobre o da razão. E alterar a trama do tempo.
3 - Proust comenta, em “O Tempo Redescoberto”, que uma daquelas madames dele é capaz de chorar... salvo engano, lendo uma página de romance.
4 - Mas, quanto ao noticiário de guerra, com fatos atrozes, reais e bem próximos, faz uma careta e logo esquece. Diria que quer esquecer rápido.
5 - Isso aponta para a banalidade da nossa capacidade de experimentar sofrimento. Que conflui com a banalidade que conhecemos para fazer sofrer.
6 - O fato em si já foi muito bem flagrado e discutido. Com o auxílio de Arendt, Milgram e comentadores. Mas o “modus” desse fato, nem tanto.
7 - Milgram, seguindo os passos de Arendt, acha, por via experimental, a obediência na origem da capacidade de fazer sofrer a outros sem sofrer.
8 - Quebra-se o mecanismo da compaixão (com + páthos), que entendo como um segundo grau de empatia (in + páthos), atribuindo-se o ato a outrem.
9 - Eu fiz o que outro me mandou fazer e creio — fui educado para tanto — que a obediência em si é correta, é decente, é digna. Logo, sou digno.
10 - Eis um álibi. Muito bem. Um dos vários. Mas ainda remanesce em nós um assombro com respeito ao “modus”: como conseguem torturar, desmembrar?
11 - Achamos que é algo que não seríamos capazes de fazer, mesmo obedecendo hierarquia ou cultura. E a chave para essa questão está no — tempo.
12 - Zizek gosta de mencionar como o Zen-Budismo é usado para, nas minhas palavras, pôr militares ausentes em relação ao tempo de seus atos.
13 - A Teoria do Fluxo (“Flow”) torna mais clara essa condição de alheamento em relação ao tempo do ato. O que é estar um passo aquém do real.
14 - Um passo aquém do AÍ, com um pé no AQUI, i.e., no absoluto... O AÍ, local (topós, τοπός) do tempo fica posto entre parênteses por duas vias.
15 - Pela via que pode ser dita apolínea por aproximação, apesar de ser a dos orientais: meditação, introspecção ou simples: repetição exaustiva.
16 - E pela via dionisíaca: num quarto, com uma amante, estamos vivendo o tempo do ilimitado. Porque o sentir é sempre indivíduo. E indivisível.
17 - Decretado o império dos sentidos, dos instintos, das paixões, das emoções, está-se alheio ao tempo do golpe de Estado, da guerra, da dor.
18 - Nesse sentido, o namoro é um ritual, dionisíaco, ocidental, de quebra do tempo — trágico: onde se dá o sofrer. E é como o vinho: uma droga.
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MALDADE E OBEDIÊNCIA
Ampliável
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A BANALIDADE DO MAL E SEU “MODUS” – SEGUNDO PASSO
1/12 - Zizek gosta de mencionar como o Zen-Budismo é usado para, nas minhas palavras, pôr militares ausentes em relação ao tempo de seus atos.
2/13 - A Teoria do Fluxo (“Flow”) torna mais clara essa condição de alheamento em relação ao tempo do ato. O que é estar um passo aquém do real.
3/14 - Um passo aquém do AÍ, com um pé no AQUI, i.e., no absoluto... O AÍ, local (topós, τοπός) do tempo fica posto entre parênteses por duas vias.
2 - Vamos digredir verticalmente, consoante a proposta do projeto TUITAÇÕES, a partir dos postalis abaixo [aqui, acima], que, excepcionalmente, ora repito.
3 - AQUI é uma noção absoluta. Nada pode estar aquém do AQUI. I.e., mais para cá do que AQUI. Não é vero? E tudo para além de AQUI está sito AÍ.
4 - Pensa sobre como isso é forte. E, ao mesmo passo, acessível. Uma noção absoluta e de um absoluto (interno) com que trabalhamos o tempo todo.
5 - Só podemos considerar algo como sito AÍ, no espaço-tempo, em relação a algo sito AQUI. Porém, qualquer representação deste algo já está: AÍ.
6 - As representações do AQUI ou do que o habite não podem estar para aquém de AQUI, logo se situam AÍ: no tempo e no espaço tridimensional.
7 – No dito de "Fragmento de Leningrado", uma nota inédita de Kant encontrada dentro dum livro, este ratifica o movimento que fizemos juntos.
8 – Ele diz, já ao fim dos seus dias, que nada pode ser constituído no espaço-tempo sem ser referido a algo intuído como sito no AQUI, absoluto.
9 – E desvenda a necessidade de um — “Sentido Interno”, título que dá à nota, congruente com a noção hodierna de propriocepção ou cinestesia.
10 – Assim, se me acompanhaste até este momento, o movimento que fizemos juntos por via tão singela equivale à descoberta de uma partícula nova.
11 – E nem somos um grande colisor de hadrões... Mas achamos a partícula cinestésica do Eu profundo, pré-temporal, sobre que se apóia o tempo.
12 – Agora, já podemos regressar, bem municiados, à banalidade do mal — ou melhor: do sofrer e do fazer sofrer, sem juízo moral — e seu “modus”.
13 – O que a Teoria do Fluxo ensina a fazer é pôr o mundo, ou o tempo entre parênteses, por meio do foco da consciência sobre o AQUI cinestésico.
14 – Eis o caminho do Zen-Budismo para atingir a paz. E se relaciona à repetição exaustiva de atos, vide “A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen".
15 – A repetição exaustiva de um mesmo ato — qualquer ato — desnuda o ator em si e põe o entorno num plano secundário, livre do fator agônico.
16 – Uma pessoa obediente, e.g., Einchmann, repete o ato de obedecer, que é o ato de alienar o ato, desde a tenra infância, e isso lhe traz: paz.
17 – Isso lhe traz a sensação condicionada, pavloviana, de prêmio, segurança. Filiação. Daí ser um homem metódico, organizado, caninamente fiel.
18 – A linguagem da ciência indutivo-experimental, para reforço, indicará, quiçá, a ativação de regiões primitivas do cérebro no ato de obedecer.
19 – A obediência, álibi de Eichmann, carrega em si mesma, portanto, uma fórmula potente para desvencilhá-lo do tempo do ato por via apolínea.